ROMA, 11 JUL (ANSA) – O macarrão à carbonara, prato símbolo da gastronomia de Roma e de toda a Itália, tem inspiração americana, de acordo com o diretor da Universidade da Cozinha Italiana, Guido Mori.   

A declaração joga combustível em uma polêmica que tomou conta do país europeu no fim de março, quando um historiador da alimentação e professor da Universidade de Parma, Alberto Grandi, defendeu que o molho à carbonara é uma receita ligada aos Estados Unidos.   

“A culinária italiana se baseia em uma contínua inovação e na síntese do que existe de melhor nas culturas do mundo. Portanto, reconhecer a origem americana da carbonara não representa uma ‘traição’, mas sim tomar consciência de nossa cultura”, declarou Mori em um debate na sede da universidade, em Florença, com o historiador gastronômico e professor Luca Cesari.   

Autor do livro “”Storia della pasta in dieci piatti. Dai tortellini alla carbonara” (“História da massa em 10 pratos: dos tortellini à carbonara”), Cesari afirma que foi um cozinheiro bolonhês, Renato Gualandi, quem inventou um prato de macarrão com ovos, bacon, creme de leite e queijo para oficiais americanos e britânicos na Riccione recém-libertada do nazifascismo em 1944.   

Curiosamente, colocar creme de leite no carbonara é considerado quase um crime hoje pelos italianos mais tradicionalistas.   

Gualandi teria levado o prato para Roma, onde trabalhou nos meses sucessivos, mas a primeira formulação da receita apareceu em 1952, em um guia americano de restaurantes de Chicago, nos EUA.   

O prato seria descrito na Itália apenas dois anos depois, na revista “La Cucina Italiana”, com espaguete, ovos, pancetta, gruyère (tipo de queijo da Suíça) e alho. A receita teve diversas mudanças ao longo das décadas e se estabilizou apenas nos anos 1990, com os ingredientes que hoje a caracterizam: ovo, queijo pecorino e guanciale (bochecha ou papada do porco), além de pimenta preta.   

“Ninguém nunca criou um prato do nada, sempre partiu de algo pré-existente, aplicando variações e melhorias”, afirmou Cesari no debate. “Estudar a gastronomia que nos precedeu amplia a bagagem cultural de um cozinheiro”, acrescentou.   

Em março, a divulgação da tese sobre a origem americana do molho à carbonara provocou irritação na Itália. “Tentam desacreditar o nosso país e se discute a italianidade de receitas e produtos símbolo”, afirmou na ocasião o subsecretário do Ministério da Agricultura e da Soberania Alimentar, Luigi D’Eramo.   

Já a Coldiretti, principal associação de agricultores do país, denunciou um “ataque surreal a pratos que simbolizam a culinária italiana”, que é candidata a patrimônio imaterial da humanidade pela Unesco.   

Além do carbonara, Alberto Grandi também questionou a origem do verdadeiro queijo parmesão e defendeu que doces como tiramisù e panetone não são tão antigos quanto se imagina.   

Em 2019, a jornalista e escritora italiana Eleonora Cozzella deu outra versão sobre a origem do carbonara, mas também ligada aos EUA. Segundo ela, em 1942, o fisiologista americano Ancel Keys, teórico da Dieta Mediterrânea, inventou um alimento adequado para as tropas aliadas presentes em Roma na Segunda Guerra Mundial, com adição de gema de ovo em pó e bacon ao espaguete. (ANSA).